sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Meu Caro Amigo - Chico Buarque e Francis Hime



Esta música, em forma de choro, cuja gravação original daria-se apenas por pandeiro, violão e piano (magníficamente tocado por Francis Hime) é uma canção em forma de carta, onde Chico passea com ar irônico e de lamento pelo momento político vivenciado em 1976.
Chico informa em linhas gerais que a ditadura ainda estava à todo vapor, com a censura ferrenha e com apologias a artifícios considerados alienantes tal como futebol, samba, choro e Rock´n Roll (lêia-se neste último, Jovem Guarda).

Com relação à censura, Chico expõe irônicamente no verso: "É pirueta pra cavar o ganha-pão Que a gente vai cavando só de birra, só de sarro(...)". Nele nota-se a mesma "pirueta" com a utilização de metáforas para fazer passar despercebido e ileso na mão dos censores.


Ainda com relação a este tema, em outro verso Chico expõe mais uma vez a difícil relação entre ele e a ditadura: "Meu caro amigo eu bem queria lhe escrever Mas o correio andou arisco Se me permitem, vou tentar lhe remeter Notícias frescas nesse disco (...)"


No mais, é esta, uma música que auto-explicita de forma lírica, irônica e crua o momento vivido em 1976.




Meu caro amigo me perdoe, por favor
Se eu não lhe faço uma visita
Mas como agora apareceu um portador
Mando notícias nessa fita

Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta

Muita mutreta pra levar a situação
Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça
E a gente vai tomando e também sem a cachaça
Ninguém segura esse rojão

Meu caro amigo eu não pretendo provocar
Nem atiçar suas saudades
Mas acontece que não posso me furtar
A lhe contar as novidades

Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta

É pirueta pra cavar o ganha-pão
Que a gente vai cavando só de birra, só de sarro
E a gente vai fumando que, também, sem um cigarro
Ninguém segura esse rojão

Meu caro amigo eu quis até telefonar
Mas a tarifa não tem graça
Eu ando aflito pra fazer você ficar
A par de tudo que se passa

Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta

Muita careta pra engolir a transação
E a gente tá engolindo cada sapo no caminho
E a gente vai se amando que, também, sem um carinho
Ninguém segura esse rojão

Meu caro amigo eu bem queria lhe escrever
Mas o correio andou arisco
Se me permitem, vou tentar lhe remeter
Notícias frescas nesse disco

Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta

A Marieta manda um beijo para os seus
Um beijo na família, na Cecília e nas crianças
O Francis aproveita pra também mandar lembranças
A todo o pessoal Adeus

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Panis et Circencis - Caetano Veloso e Gilberto Gil




Caetano Veloso e Gilberto Gil causaram grande impacto em suas apresentações no III Festival de Música Popular da TV Record, no ano de 1967. Ali, foram lançadas as bases para o Tropicalismo em sua versão musical - um movimento que mesclou manifestações tradicionais da cultura brasileira a inovações estéticas radicais daquela época, como correntes artísticas de vanguarda e da cultura pop nacional e estrangeira (como o Rock e o Concretismo). Antes de fins sociais e políticos, a Tropicália foi um movimento nitidamente estético e comportamental.

Em maio de 1968, começaram as gravações do álbum que seria o manifesto musical do movimento, do qual participaram artistas como Gal Costa, Nara Leão, Os Mutantes, Tom Zé - além dos poetas Capinan e Torquato Neto e do maestro Rogério Duprat (reponsável pelos arranjos do LP).

A faixa-título é interpretada pelo grupo paulista Os Mutantes, com sinais nítidos do conjunto: a psicodelia.

O LP foi eleito em uma lista da versão brasileira da revista Rolling Stone como o segundo melhor disco brasileiro de todos os tempos."
by Wikipedia



A Política do Pão e Circo

Panis et Circencis é um termo em latim que significa a frase "Pão e Circo" que é como ficou conhecida a política adotada pelo império Romano, que consistia em alienar a população recém chegada do campo àquela grande metrópole, com diversão e alimentação. Todos os dias havia lutas entre gladiadores nas arenas, como o coliseu, e nestas batalhas era distribuido comida para todos, então teriam diversão e comida para diminuir qualquer possibilidade de revolta contra o império.

No Brasil, em 1967, Caetano e Gil tentavam subliminarmente adequar a idéia, pois a propaganda massificante da ditadura, bem como as ferramentas alienantes por ela proporcionada, criavam condições para a alienação da população, e retratava similaridades com aquele período Romano.

Esta canção retratava sem qualquer pudor a insatisfação que os compositores sentiam vendo pequena parcela da classe artística empenhada em revoltar-se contra o Estado militar, enquanto a grande maioria preocupava-se apenas em "viver", de forma passiva frente às atrocidades que acometia o País. Muito disso é retratado no refão da música: "Mas as pessoas da sala de jantar, são ocupadas em nascer e morrer"



Eu quis cantar
Minha canção iluminada de sol
Soltei os panos
Sobre os mastros no ar
Soltei os tigres
E leões nos quintais
Mas as pessoas da sala de jantar
São ocupadas em nascer e morrer...

Mandei fazer
De puro aço luminoso punhal
Para matar o meu amor e matei
Às 5 horas na Avenida Central
Mas as pessoas da sala de jantar
São ocupadas em nascer e morrer..

Mandei plantar
Folhas de sonho no jardim do solar
As folhas sabem procurar pelo sol
E as raízes, procurar, procurar...

Mas as pessoas da sala de jantar
Essas pessoas da sala de jantar
São as pessoas da sala de jantar
Mas as pessoas da sala de jantar
São ocupadas em nascer e morrer...

Mas as pessoas da sala de jantar
Mas as pessoas da sala de jantar
Mas as pessoas da sala de jantar
Mas as pessoas da sala de jantar
Mas as pessoas da sala de jantar
Essas pessoas da sala de jantar
São as pessoas da sala de jantar
Mas as pessoas da sala de jantar
São ocupadas em nascer e morrer...



"Soltei os panos sobre os mastros no ar"... refere-se às bandeiras (nacional e outras) tão cultuadas no Estado Militar. O fato de soltar no ar os panos que estão sobre os mastros, seria uma "agressão" ao espírito nacionalista dos militares, então, uma forma de afronta.

“Mandei plantar folhas de sonho no jardim do solar...”, alusão “alucinógena” ao Solar da Fome, pensionato dos artistas recém chegados ao Rio de Janeiro

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Acorda Amor - Leonel Paiva e Julinho de Adelaide (Chico Buarque)



Esta música escancara o terror psicológico propagado pela ditadura a quem se opunha ao governo naquele momento, 1974. Chico Buarque acompanhado por Leonel Paiva compôs utilizando-se de um pseudônimo - Julinho de Adelaide - esta peça da MPB.
Após a letra, posto trecho de nota sobre esta música e sobre o próprio Julinho de Adelaide, feita por Humberto Werneck, no livro "Chico Buarque Letras e Músicas - 1997"




Acorda amor
Eu tive um pesadelo agora
Sonhei que tinha gente lá fora
Batendo no portão, que aflição
Era a dura, numa muito escura viatura
Minha nossa santa criatura
Chame, chame, chame lá
Chame, chame o ladrão, chame o ladrão

Acorda amor
Não é mais pesadelo nada
Tem gente já no vão de escada
Fazendo confusão, que aflição
São os homens
E eu aqui parado de pijama
Eu não gosto de passar vexame
Chame, chame, chame
Chame o ladrão, chame o ladrão

Se eu demorar uns meses
Convém, às vezes, você sofrer
Mas depois de um ano eu não vindo
Ponha a roupa de domingo
E pode me esquecer

Acorda amor
Que o bicho é brabo e não sossega
Se você corre o bicho pega
Se fica não sei não
Atenção
Não demora
Dia desses chega a sua hora
Não discuta à toa não reclame
Clame, chame lá, chame, chame
Chame o ladrão, chame o ladrão, chame o ladrão
(Não esqueça a escova, o sabonete e o violão)

Nota por Humberto Werneck

"Depois de Calabar, Chico percebeu que seria difícil passar alguma coisa com o seu nome. O jeito, descobriu, era disfarçar-se num pseudônimo. Nascia Julinho da Adelaide, compositor mais falante que prolífico, autor de três canções: Acorda amor, Jorge Maravilha e Milagre brasileiro. Como a Censura nada tinha contra Julinho, sua criações passavam tranqüilamente. Pouco se sabia a seu respeito até que Chico, em setembro de 1974, entrou na pele da personagem e deu uma longa entrevista ao teatrólogo Mário Prata e ao jornalista Melchíades Cunha Jr., para a edição paulista de Última Hora.O texto da entrevista não registra a colaboração do pai de Chico, que garimpou em seus livros a foto de uma mulher negra, muito bonita. Saiu no jornal com a legenda "Adelaide na época de Orfeu Negro e da Brasiliana". Mas não foi apenas com seu rosto que a mãe de Julinho apareceu na imprensa. Em 1975, a boa senhora começou a fazer palavras cruzadas, que enviava ao cruzadista do Jornal do Brasil, Carlos Silva. Ao encaminhar a primeira, Adelaide de Oliveira Kuntz mandou também uma carta onde ressaltava a importância desse hobby em sua vida - "um agradabilíssimo passatempo e um conforto para quem, como eu, está irremediavelmente condenada a uma cadeira de rodas". Carlos Silva, um cavalheiro, não apenas publicou a criação como acrescentou uma palavrinha de estímulo: "Seu primeiro problema está muito bom e esperamos que seja o início de ótimas produções." Chico diz que apesar disso ela ficou um tanto aborrecida com Carlos Silva, que corrigiu o seu problema - trocou "ratificará" por "ratificada", por exemplo.Numa carta a Mário Prata, por essa época, Chico explicou que Adelaide se tornou cruzadista ao ficar paralítica, e que ficou paralítica ao perder o filho. Julinho morreu, de fato, naquele ano de 1975, ao ser desmascarado numa reportagem do Jornal do Brasil sobre censura. Depois dessa revelação desmoralizante, a Polícia Federal passou a exigir que as músicas submetidas à sua aprovação fossem acompanhadas de cópia dos documentos do compositor.Por motivo de falecimento, Julinho da Adelaide não chegou a mandar para Brasília a sua criação número três: O milagre brasileiro (gravada tempos depois por Miúcha).


© Copyright Humberto Werneck in Chico Buarque Letra e Música, Cia da Letras, 1989

Link para a música:

http://b.radio.musica.uol.com.br/radio/index.php?ad=on&ref=Musica&busca=acorda+amor&param1=homebusca&q=acorda+amor&check=musica&x=25&y=2

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Alegria Alegria - Caetano Veloso


"Alegria, Alegria" é uma canção da autoria de Caetano Veloso que foi um dos marcos iniciais do movimento tropicalista em 1967.
Caetano Veloso, em parte inspirado pelo sucesso de A Banda, de Chico Buarque, que havia concorrido no Festival de música da Record do ano anterior, quis compor uma marcha assim como a canção de Chico. Ao mesmo tempo, queria que fosse uma música contemporânea, pop, lidando com elementos da cultura de massa da época.
A letra possui uma estrutura cinematográfica, conforme definiu Décio Pignatari, trata-se de uma "letra-câmera-na-mão", citando o mote do Cinema Novo. Caetano ainda incluíu uma pequena citação do livro As Palavras, de Jean-Paul Sartre: "nada nos bolsos e nada nas mãos", que acabou virando "nada no bolso ou nas mãos".
Como a idéia do arranjo incluía guitarras elétricas, Caetano e seu empresário na época, Guilherme Araújo convidaram o grupo argentino radicado em São Paulo Beat Boys. O arranjo foi fortemente influenciado pelo trabalho dos Beatles.





Caminhando contra o vento
Sem lenço e sem documento
No sol de quase dezembro
Eu vou...

O sol se reparte em crimes
Espaçonaves, guerrilhas
Em cardinales bonitas
Eu vou...

Em caras de presidentes
Em grandes beijos de amor
Em dentes, pernas, bandeiras
Bomba e Brigitte Bardot...

O sol nas bancas de revista
Me enche de alegria e preguiça
Quem lê tanta notícia
Eu vou...

Por entre fotos e nomes
Os olhos cheios de cores
O peito cheio de amores vãos
Eu vou
Por que não, por que não...

Ela pensa em casamento
E eu nunca mais fui à escola
Sem lenço e sem documento,
Eu vou...

Eu tomo uma coca-cola
Ela pensa em casamento
E uma canção me consola
Eu vou...

Por entre fotos e nomes
Sem livros e sem fuzil
Sem fome, sem telefone
No coração do Brasil...

Ela nem sabe até pensei
Em cantar na televisão
O sol é tão bonito
Eu vou...

Sem lenço, sem documento
Nada no bolso ou nas mãos
Eu quero seguir vivendo, amor
Eu vou...

Por que não, por que não...
Por que não, por que não...
Por que não, por que não...
Por que não, por que não...

Link para a música:
http://b.radio.musica.uol.com.br/radio/index.php?ad=on&ref=Musica&busca=alegria+alegria&param1=homebusca&q=alegria+alegria&check=musica&x=36&y=10

Cálice - Chico Buarque e Gilberto Gil



Em 1973 Chico e Gilberto Gil compuseram esta música, considerada uma das mais representativas na luta contra a ditadura militar e pela redemocratização, pois sua cadência pausada remete a uma marcha dramática cujos versos escancaram de forma incisiva o momento político.


Pai! Afasta de mim esse cálice Pai!
Afasta de mim esse cálice Pai!
Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Esta estrofe caracteriza a essência da música que a acompanhará em todos os momentos, pois o Cálice retratado detém uma ambuguidade entre uma passagem bíblica e o termo imperativo: Cale-se, este segundo, que retrata o momento ditatorial vivenciado no país e representa a repressão em todos os momentos da composição.


Como beber
Dessa bebida amarga
Tragar a dor
Engolir a labuta
Mesmo calada a boca
Resta o peito
Silêncio na cidade
Não se escuta


"Como vivenciar este momento de liberdade cerceada, engolir a seco toda as atrocidades cometidas sem que possa se contrapor ao sistema?"


De que me vale
Ser filho da santa
Melhor seria
Ser filho da outra
Outra realidade
Menos morta
Tanta mentira
Tanta força bruta...Pai!
De que me vale ser filho da pátria mãe gentil, se a realidade no Brasil é morte, tortura (mentiras utilizadas pelos militares que "justificavam" mortes com suicídios forjados) e truculência.


Afasta de mim esse cálicePai!
Afasta de mim esse cálicePai!
Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue...


Como é difícil
Acordar calado
Se na calada da noite
Eu me dano
Quero lançar
Um grito desumano
Que é uma maneira
De ser escutado

Nesta estrofe ele retrata a vida dos que se opunham ao sistema ditatorial, fazendo suas reuniões clandestinas, geralmente na calada da noite para no dia posterior colocar em prática as estratégias pensadas nestas reuniões, mas a vontade que sentiam em seu interior era gritar para tentar resgatar o povo, conformado e alienado com as progandas militares, deste estado de transe indeológico.

Esse silêncio todo
Me atordoa
Atordoado
Eu permaneço atento
Na arquibancada
Prá a qualquer momento
Ver emergir
O monstro da lagoa...Pai!

Nesta estrofe ele continua a idéia anterior, de que o silêncio do povo o atordoa, mas que ele não descançaria até ver (o emergir o monstro da lagoa) o povo revoltar-se contra o sistema e fazer a revolução do momento político, e isso se daria com o período de redemocratização do Brasil com a luta das "Diretas Já" onde o povo foi o maior agente transformador.


Afasta de mim esse cálicePai!
Afasta de mim esse cálicePai!
Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue...


Nas estrofes seguintes veremos que ele sempre criticará a ditadura e receberá uma advertência para calar-se, onde mais uma vez deixando a idéia de que o cálice é "Cale-se"

De muito gorda
A porca já não anda(Cálice!)


A Porca é o sistema ditatorial que neste momento (1973) não tinha mais o apelo e o apoio que tivera antes

De muito usada
A faca já não corta
Como é difícil Pai, abrir a porta(Cálice!)
Essa palavra
Presa na garganta

A faca refere-se às baionetas dos fuzis FAL 7.62, utilizado pelo exército brasileiro, que matou e torturou tanta gente.

Esse pileque
Homérico no mundo
De que adianta
Ter boa vontade
Mesmo calado o peito
Resta a cuca
Dos bêbados
Do centro da cidade...Pai!

O Pileque do mundo trata também da alienação da população sobre o momento político. Continua dizendo que mesmo calado, pensa e se coloca como bêbado, pois os "lúcidos" apoiavam a ditadura.


Afasta de mim esse cálicePai!
Afasta de mim esse cálicePai!
Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue...


Talvez o mundo
Não seja pequeno(Cálice!)
Nem seja a vida
Um fato consumado(Cálice!)
Quero inventar
O meu próprio pecado(Cálice!)
Quero morrer
Do meu próprio veneno(Cálice!)


Ao invés de morrer pelas mãos dos militares, prefere ele mesmo inventar seu pecado e seu veneno.


Quero perder de vez
Tua cabeça(Cálice!)
Minha cabeça
Perder teu juízo(Cálice!)
Quero cheirar fumaça
De óleo diesel(Cálice!)
Me embriagar
Até que alguém me esqueça(Cálice!)


Esta última estrofe trata justamente da inconformidade com a situação que poderia lhe custar a vida, e ele retrata uma forma de tortura utilizada pelos grandes ditadores, a aspiração de gases nocivos ao ser humano.
Link para a música:

Pra não dizer que não falei das flores - Geraldo Vandré



"Pra não dizer que não falei das flores" (também conhecida como "Caminhando") é uma canção escrita e interpretada por Geraldo Vandré. Ficou em segundo lugar no Festival Internacional da Canção de 1968 e, depois disso, teve sua execução proibida durante anos, pela ditadura militar.

A melodia da canção tem o ritmo de um hino, e sua letra possui versos de rima fácil (quase todos em ão), que facilitam memorizá-la, logo era cantada nas ruas. O sucesso de uma canção que incitava o povo à resistência levou os militares a proibi-la, usando como pretexto a "ofensa" à instituição contida nos versos "Há soldados armados, amados ou não / Quase todos perdidos de armas na mão / Nos quartéis lhes ensinam antigas lições / de morrer pela pátria e viver sem razão".
A primeira artista a interpretar "Caminhando" após o período em que a canção esteve censurada foi Simone, em 1979, conquistando enorme sucesso de crítica e público. A canção também foi regravada por Ana Belén, Zé Ramalho.



Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Caminhando e cantando
E seguindo a canção...

Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...(2x)

Pelos campos há fome
Em grandes plantações
Pelas ruas marchando
Indecisos cordões
Ainda fazem da flor
Seu mais forte refrão
E acreditam nas flores
Vencendo o canhão...

Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...(2x)

Há soldados armados
Amados ou não
Quase todos perdidos
De armas na mão
Nos quartéis lhes ensinam
Uma antiga lição:
De morrer pela pátria
E viver sem razão...

Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...(2x)

Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Somos todos soldados
Armados ou não
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não...

Os amores na mente
As flores no chão
A certeza na frente
A história na mão
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Aprendendo e ensinando
Uma nova lição...

Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...(4x)
Link para a música:

Apesar de Você - Chico Buarque



"Apesar de você" é uma canção escrita e originalmente interpretada por Chico Buarque de Hollanda em 1970. A canção, por implicitamente lidar com a questão da falta de liberdade durante a época da ditadura militar, foi proibida de ser executada pelas rádios no Brasil pelo governo Médici. No entanto, foi liberada no governo do presidente João Figueiredo. Em março de 1970, Buarque retornou ao Brasil após o exílio de mais de um ano na Itália. Seu retorno foi influenciado por André Midani, diretor de sua gravadora, que lhe assegurava "estar melhorando a situação no Brasil". Mas ao chegar, descobriu o contrário: a situação do país piorara e externou seu desapontamento escrevendo "Apesar de você", uma crítica à ditadura disfarçada de briga de namorados. Ao enviar a canção para o departamento de censura, Chico imaginou que a canção não seria aprovada, mas foi. A canção foi lançada às radios e o compacto simples atingiu a marca das cem mil cópias vendidas. No auge de seu sucesso a canção foi denunciada e o governo imediatamente proibiu sua execução pública. Oficiais do governo invadiram a gravadora de Chico, recolheram e destruiram as cópias restantes do disco. O censor que aprovou a canção também foi punido. Os oficiais do governo, no entanto, não destruíram a matriz, o que possibilitou a reedição do disco original. Num interrogatório, perguntaram a Chico quem era o você do título. "É uma mulher muito mandona, muito autoritária", respondeu. A censura de "Apesar de você" teve um impacto negativo no relacionamento entre Chico e os censores, que duraria até o final da ditadura. Chico seria implacavelmente marcado pelos censores, sofrendo suas letras as mais absurdas rejeições. A situação chegou ao ponto de ele se disfarçar, sob os pseudônimos de Julinho da Adelaide e Leonel Paiva, para aprovar três composições, uma das quais, "Acorda Amor", incluída no LP Sinal Fechado, em 1974. Descoberta a farsa, a censura criou novas exigências: toda letra apresentada teria que ser acompanhada de cópias da carteira de identidade e do CPF do compositor.
Wikipedia



Letra:
Hoje você é quem manda

Falou, tá falado Não tem discussão, não.
A minha gente hoje anda
Falando de lado e olhando pro chão.
Viu?
Você que inventou esse Estado
Inventou de inventar
Toda escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar o perdão.
Apesar de você amanhã há de ser outro dia.
Eu pergunto a você onde vai se esconder
Da enorme euforia?
Como vai proibir
Quando o galo insistir em cantar?
Água nova brotando
E a gente se amando sem parar.
Quando chegar o momento
Esse meu sofrimento
Vou cobrar com juros.
Juro!
Todo esse amor reprimido,
Esse grito contido,
Esse samba no escuro.
Você que inventou a tristeza
Ora tenha a fineza de “desinventar”.
Você vai pagar, e é dobrado,
Cada lágrima rolada
Nesse meu penar.
Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Ainda pago pra ver
O jardim florescer
Qual você não queria.
Você vai se amargar
Vendo o dia raiar
Sem lhe pedir licença.
E eu vou morrer de rir
E esse dia há de virantes do que você pensa.
Apesar de você
Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Você vai ter que ver
A manhã renascer
E esbanjar poesia.
Como vai se explicar
Vendo o céu clarear, de repente,
Impunemente?
Como vai abafar
Nosso coro a cantar,
Na sua frente.
Apesar de você
Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Você vai se dar mal, etc e tal,
La, laiá, la laiá, la laiáÂ…Â….


Análise:

"Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão, não."


Este trecho demonstra a forma de governo do então presidente do país o General Emilio Garrastazu Médici, a forma autoritária e tirana que o governo militar estabelecia naquele momento.


"A minha gente hoje anda
Falando de lado e olhando pro chão"


Mostra como estava a auto-estima dos cidadãos brasileiros bem como a impossibilidade de expor de público as opiniões sobre os mais diversos assuntos concernentes à república, tais como política, economia, literatura, cinema, teatro, coisas que nos dias de hoje seriam impensávei de não ser conversados nos botequins da cidade.



"Você que inventou esse Estado
Inventou de inventar
Toda escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar o perdão."


Quando Chico diz este Estado, o fala num propósito dúbio, de Estado (governo) e estado (de tensão e repressão).


"Apesar de você amanhã há de ser outro dia.
Eu pergunto a você onde vai se esconder
Da enorme euforia?
Como vai proibir
Quando o galo insistir em cantar?
Água nova brotando
E a gente se amando sem parar."


Chico profetizava que num futuro próximo este, que no governo estava, não mais teria influência na vida das pessoas e que o Brasil seria um país democrático como de fato o é hoje em dia. Utilizando-se de metáforas, constragia a autoridade fazendo questionamentos aparentemente fúteis do cotidiano para expressar que todo o autoritarismo de hoje de nada valeria amanhã.

Chico segue durante toda a música, levantando estes questionamentos e concluindo sempre que num futuro a ordem social imposta pelos militares seriam contestadas veementemente e todo o povo cantaria a democracia, como de fato aconteceu nas Diretas Já e até hoje ocorre em todas as manifestações políticas e culturais do país.
Link para a música:

Texto Inaugural

Este é um espaço onde a democracia é a palavra de ordem, tanto na forma de interação quanto na idéia que preceitua este projeto.
Sabedores que somos da recente história do país e dos momentos de privação de liberdade de expressão e produção, nada mais justo do que rememorarmos, para que não deixemos que isto caia no esquecimento coletivo, essa fase que tanto terror impôs aos produtores culturais, artistas, intelectuais e ao povo em geral.

Aqui nós faremos uma exposição leve e didática para que este projeto seja mais um a exaltar a coragem, determinação e genialidade, daqueles que com arte enfrentaram o regime ditatorial e contribuiram para a redemocratização do país.

A idéia é postar as letras, fotos, curiosidades, interpretações e estórias que cercam as produções musicais da época da ditadura.
As análises, notas e estórias serão esxtraidas de diversos meios de comunicação e publicações, além de minhas, mas sempre que proveniente de terceiros, citaremos o autor ou publicação.

Todas as contribuições para alimentação do blog serão muito bem vindas, é um projeto que, se tudo transcorrer bem, será elaborado por várias mãos.